Muito se fala, principalmente no contexto de ingresso em universidades públicas, sobre as cotas raciais, sociais e de escolas públicas. Em especial, neste texto, o Politize! trará uma explicação sobre o que são as cotas raciais, como e por que surgiram, o histórico e argumentos usados a favor e contra elas. Fique ligado! Show
Se preferir, ouça nosso episódio de podcast sobre esse assunto! Listen to “#033 – Cotas raciais no Brasil” on Spreaker. O que são as cotas raciais?As cotas raciais são ações afirmativas aplicadas em alguns países, como o Brasil, a fim de diminuir as disparidades econômicas, sociais e educacionais entre pessoas de diferentes etnias raciais. Essas ações afirmativas podem existir em diversos meios, mas a sua obrigatoriedade é mais notada no setor público – como no ingresso nas universidades, concursos públicos e bancos. Aprenda também: tudo sobre o movimento negro! As cotas raciais são uma medida de ação contra a desigualdade num sistema que privilegia um grupo racial em detrimento de outros – esses, oprimidos perante a sociedade. Ao contrário do que diz o senso comum, cotas raciais não se aplicam somente a pessoas negras. Em várias universidades, por exemplo, existem cotas para indígenas e seus descendentes, que visam abarcar as demandas educacionais dessas populações. Há, em alguns lugares, , também – caso contrário, estão inclusas nas cotas para negros. Como as cotas funcionam?Para que usufruam das cotas, as pessoas devem assinar um termo em que se autodeclaram negras, indígenas ou pardas, que então será a garantia documental do uso dessa política afirmativa. Às vezes, quando se trata de concurso público para algum emprego, a pessoa pode passar por uma entrevista. A existência dessa entrevista, por exemplo, é algo que causa alguma discórdia quando se trata de cotas raciais, em razão de ela ser subjetiva. Afirma-se que existe a possibilidade de haver jogos de influência, pagamento de propina e outras atitudes por meio de quem quer usufruir das cotas raciais ilegalmente – uma pessoa branca, por exemplo. Saiba mais sobre povos indígenas no Brasil! Por que cotas raciais existem?Algumas pessoas explicam as cotas raciais por meio do conceito da equidade aristotélica. Aristóteles, o filósofo grego criou uma teoria que consiste em: tratar desigualmente os desiguais para se promover a efetiva igualdade. Se duas pessoas vivem em situações desiguais e forem concorrer nas mesmas condições, concretamente a desigualdade será perpetuada. As ações afirmativas seriam uma maneira de colocar essas pessoas no mesmo patamar de concorrência. Leia também: Desigualdade racial no Brasil: uma realidade atual A desigualdade no Brasil abrange o âmbito econômico, social e, principalmente, o da educação e das oportunidades. Negros representam 53,6% de toda a população brasileira e, mesmo sendo maioria, estão numa minoria de espaços considerados importantes, como chefias de empresas e outros cargos de relevância social. Apenas 12% da população preta e 13% da parda têm ensino superior. Entre os brancos, o número é 31%. A diferença no nível de escolaridade se reflete também na renda. Conforme dados de 2015 do IBGE, o salário da população preta e parda equivale a 59,2% da população branca. Em se tratando da mulher negra: seu salário equivale a 35% ao de um homem branco, segundo dados do PNAD 2014. O quadro da desigualdade social entre negros e brancos ocorre em função dessa diferença de oportunidades. Essa questão porém, está historicamente relacionada à escravidão. Será que a escravidão realmente acabou no Brasil? Descubra! A escravidão negra no BrasilHá 128 anos, a escravidão no Brasil foi proibida pela Princesa Isabel. Essa é uma história que a maioria das pessoas conhece. Contudo, o processo de abolição da escravatura não foi simples: o sistema de produção latifundiário e de monocultura era o sistema financeiro-econômico predominante há décadas no Brasil, e pôr um fim definitivo a ele demorou. Na verdade, existem ainda hoje muitos casos de trabalho análogo à escravidão em fazendas no Brasil. Durante 354 anos houve escravos negros no Brasil. Um censo realizado por D. Pedro II em 1872, já próximo ao ano da abolição (1888), estimou uma população de 10 milhões de pessoas, em que 15,24% eram escravos. Essa mesma população, quando a escravatura foi abolida, não recebeu garantias do Estado nem qualquer ação de políticas públicas em seu favor. Pelo contrário, foram expulsos das fazendas – onde tinham, em condições desumanas, um teto sob onde dormir e comida para se alimentar. Tiveram de procurar empregos e casas numa sociedade racista e que não estava interessada na criação de mecanismos de inclusão, para conceder oportunidades às pessoas negras. Das senzalas, portanto, foram para as favelas. Leia também: Discriminação racial no mercado de trabalho Como as cotas surgiram no Brasil?Em 1997, apenas 1,8% dos jovens entre 18 e 24 anos que se declararam negros havia frequentado uma universidade, segundo o Censo. As políticas públicas em torno do direito universal de acesso ao ensino, principalmente superior, começaram a ser reivindicados, então, pelo movimento negro. Quando a questão das cotas para estudantes negros chegou ao Supremo Tribunal Federal, em 2012, foi votada como constitucional por unanimidade. Mas foi em 2000 que, por conta de uma lei estadual, a Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ) foi a pioneira em conceder uma cota de 50% em cursos de graduação, por meio do processo seletivo, para estudantes de escolas públicas. Depois da UERJ, a Universidade de Brasília (UnB) se propôs a estabelecer as ações afirmativas para negros no vestibular de 2004. A instituição foi a primeira no Brasil a adotar as cotas raciais. De lá para cá, várias universidades e faculdades vêm adotando sistemas de ações afirmativas para os vestibulares e exames admissionais. A consolidação das cotas aconteceu principalmente com a lei nº 12.711, de agosto de 2012, conhecida também como Lei de Cotas. Ela estabelece que até agosto de 2016 todas as instituições de ensino superior devem destinar metade de suas vagas nos processos seletivos para estudantes egressos de escolas públicas. A distribuição dessas vagas também leva em conta critérios raciais e sociais, pois considera fatores econômicos. Cotas raciais: o que diz quem é contra e quem é a favor da medida?Ao longos dos anos, as cotas raciais foram objeto grande e interminável debate. Entenda as principais alegações de quem é favorável e quem é contrário a elas. Argumentos favoráveis
Argumentos contrários
Balanço das cotas raciais no Brasil: houve mais inclusão?Em dados objetivos, sim. Em 1997 era 1,8% da população negra que ingressou no ensino superior. Em 2011, saltou para 11,9% – ou seja, houve um aumento de quase 1000%. Em 2014, 30,9% das vagas em institutos federais e 22,4% nas universidades foi destinada a pretos, pardos e indígenas – 1/3 e 1/4 do total de vagas, respectivamente. O salto no número de ingressos se deve às cotas raciais e também à capacidade dos estudantes. Segundo dados do Sistema de Seleção Unificada, a nota de corte para os candidatos convencionais a vagas de medicina nas federais foi de 787,56 pontos. Para os cotistas, foi de 761,67 pontos. A diferença entre eles, portanto, ficou próxima de 3%. Segundo o Instituto de Pesquisas Aplicadas (IPEA), a taxa líquida de matrícula de jovens de 18 a 24 anos – que mede o número de matriculados no nível esperado de ensino para aquela faixa etária – mais que quintuplicou entre os negros. No Boletim Políticas Sociais: acompanhamento e análise nº 19, também do IPEA – criado por ocasião da programação em torno do Ano Internacional dos Afrodescendentes no ano de 1992 – apenas 1,5% dos jovens negros nesta faixa etária estavam na universidade. Em 2009, eram 8,3%. A frequência dos jovens negros na universidade, que correspondia a 20,8% da frequência dos brancos em 2002, passou a corresponder a 38,9% em 2009. Por serem recentes, é bastante difícil coletar dados qualitativos e realizar estudos de todas as universidades em relação às cotas raciais. Porém, a Universidade de Brasília, a primeira a ter cotas raciais, fez estudos e uma análise sobre a aplicação e os resultados das ações afirmativas. Os dados nacionalmente integrados que mensurem a permanência de cotistas, em números e termos qualitativos, ainda não foram sistematizados. Se você gostou deste conteúdo não deixe de ler outro que fizemos sobre o movimento negro. O que você acha sobre as cotas raciais? É a favor ou contra? Deixe seu comentário! – Nota: alguns dos argumentos são utilizados pela pesquisadora na área de Filosofia Política e secretária-adjunta da Secretaria de Direitos Humanos e Cidadania de São Paulo, negra, Dijamila Ribeiro. Publicação original em 22 de outubro de 2016 Já assistiu nossos vídeos no Youtube? Inscreva-se no nosso canal! |